sábado, 25 de outubro de 2014

A PEDRA DE TROPEÇO



A PEDRA DE TROPEÇO 

FRANCISCO DE PAULA MELO AGUIAR (*)

 [...] Nunca me esquecerei que no meio do caminho 
Tinha uma pedra [...] 
                                 Carlos Drummond de Andrade 

O homem por mais sábio que pareça ser no tempo de sua existência, jamais estará imune de tentações as mais diversas possíveis em todos os sentidos de sua vida, pois, a sua personalidade é constituída de id, ego e superego, no dizer científico de Freud. Através desses elementos personificados e individualizados, tais elementos constitutivos de nossa personalidade, vivem se confrontando diuturnamente enquanto vida tiver. Isso é fato cientificamente comprovado. O id quer o prazer, tirar vantagem em tudo, é aí onde o indivíduo tem a língua maior do que o trem, macho de mais e nunca perde nada, parece muito com a função do poder legislativo, projeta tudo e nada realiza, sempre joga para os outros suas dificuldades e ilações passadas, presentes e futuras. Por outro lado, o ego é ao controlador e executor dos atos planejados antecipadamente, é bem parecido com a função do poder executivo em qualquer esfera de poder, como também parece com o quero posso e mando da política partidária brasileira por determinadas oligarquias em qualquer fase da política nacional e até mais internacional que a humanidade tenha dela conhecimento do passado, do presente visando permanecer no poder. E por fim o componente, superego, aqui entendido como sendo a censura ao passado, ao presente e ao futuro, bem parecida com as funções exercidas pelo poder judiciário no tocante a aplicação da lei parida pelos poderes legislativo e executivo, como forma de distribuir a justiça entre os governos e seus súditos na versão moderna que se tem de poder de Estado. A democracia a brasileira é um tropeço na vida nacional, tendo em vista que o cidadão é obrigado a votar, porém, é obrigado a ficar calado durante o período eleitoral, tendo em vista a lei da reedição da lei da mordaça, onde a população é obrigada a ficar calada para não fazer qualquer tipo de avaliação sobre a vida dos candidatos envolvidos no pleito. Os meios de comunicação nos parece manipulados por quem tem mais ou dispõe do poder local, estadual, regional e nacional. As pesquisas encomendas pelos grupos oligárquicos envolvidos, são registradas perante a autoridade judiciária patrocinadora das eleições, porém, seus resultados são usados para manipular e alienar pessoas analfabetas funcionais e ou não, as chamadas indecisas e ideologicamente inseguras. Aí tem órgãos dos meios de comunicação que ficam durante suas programações, dando ênfase de que “A” já passou a frente de “B” com tanto por centro de diferença. Agora perguntamos: e isso também é um método ou paradigma de direcionar o resultado da eleição não? Tem eleitor que vota em quem vai ganhar, nada sabe sobre a vida do candidato “A” e ou “B”, vota porque acha o candidato feio e ou bonito, por esse ou aquele programa social desenvolvido pelo poder público, pago por toda a população antecipadamente via a cobrança direta e indireta de impostos federais, estaduais e municipais. Isso é uma conduta deplorável assim proceder. Isto é o que Carlos Drummond de Andrade, com maestria, usando outras palavras em sua composição: “No meio do caminho¹”, segundo sua visão de homem e de mundo em pleno século XX, uma vez que “No meio do caminho tinha uma pedra; Tinha uma pedra no meio do caminho; Tinha uma pedra No meio do caminho tinha uma pedra”, e continua sua visão retórica sobre o tropeço modernista, tendo em vista que “Nunca me esquecerei desse acontecimento; Na vida de minhas retinas tão fatigadas; Nunca me esquecerei que no meio do caminho; Tinha uma pedra” e conclui seu pensar e ou filosofar literário laico, “tinha uma pedra no meio do caminho; No meio do caminho tinha uma pedra”. O ser humano sempre vai depender de alguém de uma coisa e ou de um objeto. Não somos auto-suficientes em nada, um ser vai sempre depender de outro ser, assim como um objeto vai completar o criar, o fazer, o sonho de outro em qualquer dimensão da historicidade da vida até então conhecida. Os argumentos humanos vivem de convergência e de divergência entre si. Assim sendo, podemos resumir, por analogia, de que a pedra no caminho dos candidatos “A” e ou “B”, que trata o ilustre escritor e poeta é justamente deixar o eleitor, enquanto cidadão mudo, sem direito a vez e a voz e ainda é obrigado a comparecer para votar no dia das eleições. Durante o processo eleitoral o cidadão eleitor tem que ficar com a boca calada, se abrir a boca nos meios de comunicação: rádio, televisão, jornais, internet, etc, serão importunados via processos e multas milionárias. É a lei do silêncio pleno oficial. E ainda chamamos isso de democracia plena e de estado de direito. Assim povo bom é povo calado. 

 A expressão lingüística e/ou idiomática bíblica, constante no Antigo e no Novo Testamento, de origem hebraica e/ou aramaica² (língua falada por Jesus Cristo) denominada de “pedra de tropeço”, pode ser compreendida como sendo, o comportamento e ou atitude do indivíduo que conduz e/ou induz alguém a pecar. Etimologicamente falando, o termo hebraico “mikshow” é traduzido para “pedra de tropeço”, mencionado na Septuaginta como sendo “skandalon”. Assim sendo, o termo idiomático português escândalo vem daí sua originalidade. Ressaltamos de que o termo grego “skandalon” tem significado diferente ao que atualmente atribuímos na língua portuguesa quando falamos o termo escândalo. Porém, o “skandalon” de origem grega é um substantivo associado sempre a um verbo, tendo em vista que “skandalizo” é constituído do sufixo “iz”, como acontece em Português com o verbo escandalizar, que significa ao pé da letra levar ou fazer alguém a tropeçar e ou conduzir e ou induzir alguém a pecar³. É a causa que leva a pecar, literalmente falando. Por analogia ao texto bíblico o termo “pedra de tropeço”, significa que na estrada da Palestina antiga existia pedra, seixo, etc., por isso os usuários levavam “topadas” e chamavam palavrões, cometendo assim o pecado, o perjúrio. De modo que “skandalon” é a “pedra de tropeço”, e “proskomma”, palavra de origem grega significa “propeçando”. Assim sendo, tanto “skandalon”, de origem hebraica/aramaica, quanto “proskomma” de origem grega, ambas são usadas na Primeira Carta de São Pedro, capítulo 2, versículo 8, significando a “pedra de tropeço” e bem assim “a rocha que faz cair”. É uma prova de que o escritor da referida carta não era um leigo qualquer na literatura ou no conhecimento lingüístico. A Bíblia Sagrada nos ensina que não devemos botar uma pedra no caminho de um cego, por exemplo, o que significa a “pedra de tropeço”, tendo em vista que a palavra escândalo tem origem latina e daí vem tal proibição, de modo que tal significado casa diretamente com o significado primitivo do termo grego, sem qualquer tipo de delonga. De modo que o significa de “pedra de tropeço” tem tudo a haver com o espaço físico da Palestina4. 

 No Velho Testamento, por analogia ao uso da Septuaginta, como por exemplo, o Salmo 140, versículo 9, bem semelhante ao que São Mateus, capítulo 13, versículo 41, de modo que qualquer deslize da conduta material e ou espiritual do ser humano que o leve ao pecado e a ”pedra de tropeço”5. 

 A inveja, o escárnio, falar da vida alheia, a gula, desejar a mulher do próximo, a cobiça, querer ser sem ser, a vaidade, a luxúria, como é tratada no dizer do escritor João Ubaldo Ribeiro (1999), em sua obra “A casa dos Budas Ditosos”, não obstante o ilustre escritor ser conclusivo aos afirmar que “eu não pequei contra a luxúria. Quem peca é aquele que não faz o que foi criado para fazer. E eu fiz o que Ele me criou para fazer” e continua seu pensamento: “não quero entender nada. Quero acreditar, mas não posso ter certeza, não se pode ter certeza de nada, que Deus me terá em Sua Glória e sei que Ele agora está rindo”. É o diálogo prosaico travado entre aquele brilhante escritor botando o palavreado dele na boca de Deus. Durma com esse entendimento. Assim podemos entender que o falso testemunho, o perjúrio, a falta de educação individual, a falta de crença, a vagabundagem, fazer filho para os outros criar, esperar tudo na boca como pinico, sem redar uma palha, como enfatizam os nossos irmãos nordestinos, a corrupção, o ganhar dinheiro fácil via o crescimento de políticos de mãos sujas, o “ganhar” mais de uma vez o premio da loteria esportiva, querer ganhar ou ser vitorioso em tudo sem justificativa para isso, ser aprovado em estudar, comprar fiado e não pagar, prometer e não cumprir, se fizer uma promessa com Nossa Senhora da Penha, para pagar com um punhado de areia, vai deixar fiado mesmo, por falta de coragem, ação e atitude de ir a praia da referida Virgem e trazer o punhado de areia até o altar onde a mesma é venerada. Tudo isso é a “pedra de tropeço” cantada em versos e prosa na Bíblia Sagrada, e bem assim, é a pedra “no meio do caminho” de Carlos Drummond de Andrade. O diferencial é apenas uma questão linguística em função do tempo em que foram escritas e vivenciadas na civilização humana. Em ambos sentidos é uma questão cultural. 

 De modo que em tempo de campanha política, por exemplo, aparecem os pobres da vida pública e privada dos candidatos a qualquer cargo eletivo, aí o bicho pega, todos querem ser santos, porém, o fogo cruzado é de vaca desconhecer bezerros, conforme nos ensino o ditado popular. É pedra de mais no caminho, apesar de aparecer três vezes no Novo Testamento Bíblico Sagrado, o termo “aposkopos” que significa “sem causar tropeço a ninguém”, bem como no dizer retórico de São Paulo, na Primeira Carta aos Coríntios, capítulo 8, versículo ao, afirma que “por isso, se a comida escandalizar a meu irmão, nunca mais comerei carne, para que meu irmão não se escandalize”, e isso é um exemplo concreto para não causar o pecado. O ato de comer carne nessa visão é a “pedra no caminho”. Por fim, o reformador protestante Martinho Lutero, no século XVI, enfatiza de que "a crença comum de que a Missa é um sacrifício"6 , o que por analogia literalmente falando, isso é uma dentre milhares de "pedra de tropeço" e ou “de pedra “no meio do caminho”, que se apresenta direta e indiretamente na vida dos seres humanos por sua curta passagem sobre a terra. Assim a humanidade vive e convive sempre botando e tirando a pedra no caminho da política, da família, da segurança pública, da educação de qualidade, dos meios de comunicação, da habitação, da família, da igreja, da qualificação e habilitação profissional, das drogas, dos crimes premeditados, das injúrias, das calúnias e das difamações, dos projetos sociais, das reformas estruturantes, da casa para morar, da água para beber, da cultura, do turismo, do emprego, da liberdade, do respeito, do ser homem, do ser mulher, do estudar de verdade, do trabalho, do sonhar por dias melhores, do direito de escolher o que fazer de seu futuro, porque a vida é uma questão de escolha, etc., onde toda água que cai na planície e no monte tem o destino certo que é o mar...

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 ¹ Cf.: http://letras.mus.br/carlos-drummond-de-andrade/807509/ 
 ² Cf.: http://pt.wikipedia.org/wiki/B%C3%ADblia_Hebraica 
 ³ Cf.: O Evangelho de São Mateus: introdução e comentário – Page 271 R. T. France – 1985 "(ii) Em pedras de tropeço (18:6–9) Estas palavras estão relacionadas pela palavra skandalizo (“causa para pecar”, v. 6,8,9) e skandalon (“tentação (para pecar”) 3 (três) vezes em v. 7), a “pedra de tropeço”, algo que faz alguém tropeçar. 
4 Cf.: Geoffrev W. Bromilev. The international standard Bible encyclopedia - página 6411995 "O conceito de uma pedra de tropeço foi especialmente apropriado para uma terra rochosa como a Palestina, onde pedras e seixos são abundantes em todas as estradas não pavimentadas (em contraste com os países com solo aluvial, como o Egito ou a Mesopotâmia)." 
5 Cf.: Ramesh Khatry The Authenticity of the Parable of the Wheat and the Tares and Its ... 2000 página 137 - "Tematicamente, o uso em São Mateus 13:41 se assemelha ao de tradição judaica onde skandalon meramente significa qualquer coisa que leva ao pecado. Por exemplo, em Mateus 13:41 é muito semelhante a LXX Ps 140:9. LXX Ps 140:9 – apo skandalōn tōn ergazomenōn tēn" 
 6 Cf.: Robert C. Croken Luther's first front: the Eucharist as sacrifice page 26 – 1990 "Um segundo obstáculo (e é significativo que Lutero considere uma "segunda" pedra de tropeço) para a verdadeira doutrina da Missa é a crença comum de que a Missa é um sacrifício. De acordo com essa crença, Cristo é oferecido a Deus ..."

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(*)
Da Academia Paraibana de Poesia 
Da Academia de Letras do Brasil 
A PEDRA DE TROPEÇO 
www.recantodasletras.com.br

Texto cedido pelo autor Francisco De Paula Melo Aguiar

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